O Repórter

Lula ou Bolsonaro? Uma escolha de Sofia

Corrupção, mentiras, desmandos marcam as duas candidaturas

Por Alex de Souza | OREPORTER.COM
04 de outubro de 2022 às 15:34
Atualizada em 04 de outubro de 2022 às 17:57
Compartilhe a notícia:
divulgação
Lula recebeu 57 milhões de votos no 1º turno; Bolsonaro, 51 milhões. Um dos dois decide os rumos do país nos próximos 4 anos.
Lula recebeu 57 milhões de votos no 1º turno; Bolsonaro, 51 milhões. Um dos dois decide os rumos do país nos próximos 4 anos.

RIO - Chegamos naquele momento em que muitos preferiam adiar ou nem ver chegar. Optar pelo menos pior. Chegamos à escolha de Sofia.

Você lembra da expressão, mas não sabe de onde veio? Te dou um spoiler. " A escolha de Sofia" é um filme de 1982, baseado no romance de William Styron.

O filme trata do drama de uma mãe polaca, filha de pai antissemita, presa num campo de concentração com os seus dois filhos durante a Segunda Guerra.

Sofia, interpretada lindamente por Meryl Streep, é forçada por um soldado nazista a escolher qual dos dois filhos ela salvaria da execução nos campos de concentração. Essa dolorosa escolha afetaria Sofia pelo resto de sua vida.

É exagerado usar o termo para estas eleições? Talvez. Mas, certamente, a escolha que faremos nos afetará a todos, senão pelo resto de nossas vidas, pelos próximos quatro anos.

O país se dividiu entre Esquerda e Direita, Lula e Bolsonaro. Posso dar argumentos muito plausíveis às duas vertentes para que uns não votem nos outros e talvez nem em si mesmo.

Vamos começar pelo vencedor do 1º turno: Lula. O petista entrou na política na década de 1968, durante a ditadura militar e até chegar ao Palácio do Planalto fez 4 tentativas. Quando se declarou moderado, ou paz e amor, finalmente chegou ao cargo máximo da nação, em 2002, vencendo José Serra (PSDB), no 2º turno com 61% dos votos válidos.

Lula transformou-se. Seguiu a agenda política e econômica de seus antecessores (Collor e FHC) e, surfando na onda da estabilidade do Real (do qual foi contra), viu a economia avançar. Ainda candidato, pregava o calote ao FMI. Chamado à razão e imbuído da faixa presidencial, pagou a dívida, fez caixa e até emprestou dinheiro ao Fundo Monetário Internacional.

O Operário foi "o cara" do presidente americano Obama. Destaque em revistas internacionais, tirou o país do mapa da fome, mas enfiou a nação num emaranhado de corrupção, num esquema nunca antes visto na história desse país.

Basta olhar as condenações da Lava Jato. E pra ser justo, alinhado com a Justiça e não te cansar, cito aquelas do PT, que não foram anuladas como as condenações de Lula: Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, condenado a 5 anos de prisão por lavagem de dinheiro; João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, condenado a 15 anos por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, José Dirceu do PT, condenado a 23 anos por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.

Lula foi quase um versículo bíblico. "Mil cairão ao teu lado, e dez mil à tua direita, mas não chegará a ti". Que o diga, Sérgio Moro, julgado por seus pares como parcial e impedido de seguir como juiz da Lava Jato, Moro viu suas decisões caírem por terra.

No dia 8 de março de 2021, o ministro Edson Fachin anulou as condenações de Lula na Lava Jato. Na decisão, o ministro entendeu que a vara de Curitiba não era a jurisdição correta para o processamento e julgamento da ação penal contra o ex-presidente, porque não envolvia somente fatos relacionados à Petrobras.

Lula, portanto, não foi absolvido. O processo foi anulado e precisava ser retomado na vara correta para ser julgado, o que de fato nunca aconteceu. Especialistas dizem que não houve absolvição, já que a decisão da Suprema Corte não julgou o mérito das acusações.

No entanto, isso não apaga o fato de que o desvio de bilhões de reais em dinheiro público levou prejuízo sem precedentes à Saúde, à Economia, à Educação e, claro à imagem do país.

Um levantamento do Ministério Público Federal no Paraná mostrou que nos últimos sete anos já foram homologados acordos de leniência, de delação premiada e de repatriação, que garantiram  a devolução de 25 bilhões de reais desviados dos cofres públicos. Corrupção flagrante.

Por muito menos, um nome sujo no Serasa (quem sabe...), você é impedido de conquistar uma vaga de emprego numa pequena empresa.

Como que uma mancha dessa magnitude no currículo pode não fazer diferença para que alguém queria sentar-se à cadeira de presidente da República?

Na outra ponta do ringue, digo do pleito, Jair Messias Bolsonaro. Entrou para a política em 1988, ao se eleger vereador da cidade do Rio de Janeiro pelo Partido Democrata Cristão.

Ex-capitão do Exército. Nos arquivos militares, a indisciplina. Em 1988, muito antes de saber que seria um dia presidente da República, o milico Bolsonaro traçou um plano para estourar bombas em unidades militares com o objetivo de protestar contra os baixos salários. Fez ainda, sem autorização de seus superiores, um artigo para a revista "Veja", pedindo aumento salarial para a tropa. Foi preso por 15 dias.

Ainda depois de tantos anos, em 15 de maio de 2017, ao ser questionado em reportagem da Folha de S. Paulo, o atual presidente não conseguiu enxergar que errou ao afrontar as regras do Exército e classificou a pauta do jornal como "pauta de merda".

O eleitor de Bolsonaro pode também não enxergar a gravidade dos atos de seu "mito" naquela ocasião. Mas as escolhas tortas do ex-capitão o acompanham até hoje e qualquer semelhança não é mera coincidência.

Ataques frequentes à democracia têm partido do Palacio do Planalto, embates sem sentido com a Suprema Corte do país marcam de forma tacanha a passagem de Bolsonaro pela Presidência da República, com direito a brigas insossas com a imprensa e desrespeito sem noção às mulheres.

A ingerência sobre a saúde também chama atenção. Escolhas perturbadoras de ministros incompetentes, indicação frequente de remédios que não fazem efeito algum para o combate ao Covid-19 e a demora em decidir pela compra da vacina, que poderia salvar milhares de vida nessa pandemia. Tudo isso na conta da indisciplina do ex-capitão do Exército.

Ao ser questionado sobre erros em seu governo, diz na cara dura que o que houve foi apenas "equívocos".

"Não acredito em erros, pode ter acontecido um equívoco ou outro, não passa na minha cabeça no momento”, disse em entrevista à Rede TV, no mês passado.

Mexendo no palheiro encontramos agulhas aos montes. A corrupção é democrática e não detém a exclusividade de um partido. Seguindo a imparcialidade jornalística, o tema também ronda a extrema-direita.

Lembremos: corrupção no Ministério da Educação, onde o ex-ministro da Educação (MEC) e pastor da Igreja Presbiteriana de Santos, Milton Ribeiro teria comandado um esquema que exigia pagamento de propina para as igrejas dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, em troca de contratos de obras federais para construção de escolas. O inquérito corre sob sigilo no Supremo Tribunal Federal (STF), após interferências do presidente Jair Bolsonaro.

Em 2020, o governo Bolsonaro foi responsável pela criação de um “orçamento secreto”, possibilitando que deputados e senadores façam repasses de verbas públicas sem que haja um destino ou destinatário declarado – tirando a transparência de operações bancárias parlamentares.

Também em 2020, Fabrício Queiroz, e ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), foi preso em uma operação da Polícia Civil e do Ministério Público (MP) de São Paulo. Ele era investigado pela participação em rachadinhas na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), onde o filho de Bolsonaro ocupou uma cadeira por 4 mandatos. De acordo com o MP, Fabrício recebeu R$ 2 milhões em 483 depósitos de assessores ligados a Flávio.

Mais atual, um dos principais casos investigados durante a CPI da Covid-19 foi a compra da vacina indiana Covaxin, produzida pelo laboratório Bharat Biotech. Em depoimento, o deputado federal Luis Claudio Fernandes Miranda (DEM-DF) e o irmão Luis Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do ministério da Saúde, revelaram um suposto esquema de fraude na negociação para a compra de 20 milhões de doses do imunizante. A denúncia apontava um envolvimento do próprio Ministério da Saúde e a empresa brasileira Precisa Medicamentos, responsável pela venda da vacina no Brasil.

O deputado afirma que Bolsonaro estava ciente sobre o esquema, visto que os irmãos tiveram um encontro com o presidente no qual foi apresentada a documentação fraudulenta. Assim como Lula, Bolsonaro disse que não sabia de nada.

A próxima denúncia fez com que o UOL tivesse reportagem censurada por pedido à Justiça do filho do presidente, Flávio Bolsonaro.

Desde os anos 1990, Bolsonaro, seus três filhos mais velhos, sua mãe, cinco irmãos e duas ex-mulheres adquiriram 107 imóveis no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília. Desse total, ao menos 51 foram negociados com dinheiro vivo. Pelo levantamento, não é possível identificar o modo de pagamento de 26 imóveis, que somaram R$ 1,99 milhão em valores corrigidos.

E para deixarmos as comparações de modo equânime podemos parar por aqui. Pois você eleitor já tem motivos suficientes para enxergar o lado sombrio das duas candidaturas.

Desopile o fígado. Antes de fazer a sua dolorosa escolha entre Lula ou Bolsonaro, vale a pena saber por que Meryl Streep (lembra dela?) ganhou o Oscar de melhor atriz pelo longa "Sophie's Choice", "A Escolha de Sofia".

O filme ainda foi indicado nas categorias de melhor fotografia, melhor figurino, melhor trilha sonora original e melhor roteiro adaptado.

Encerro, portanto, com a frase atribuída a George Orwell, mas que na verdade é de William Randolph Hearst: "Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto é publicidade”.

Últimas de Opinião