O Repórter

Técnico da França, Deschamps prefere os títulos aos aplausos

Deixado de fora das discussões sobre os melhores treinadores do mundo, o francês pode erguer mais uma taça neste domingo

Por OREPORTER.COM
17 de dezembro de 2022 às 10:50
Atualizada em 17 de dezembro de 2022 às 11:19
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Fotos: FIFA
Didier Deschamps está a uma vitória de um histórico bicampeonato.
Didier Deschamps está a uma vitória de um histórico bicampeonato.

DOHA* - Como capitão, ele levou a França ao primeiro título mundial. Como técnico, conduziu a seleção ao segundo. Entre as duas conquistas, comandou o Monaco na primeira final de Liga dos Campeões da história do clube e quebrou o jejum de três décadas do Olympique de Marselha no Campeonato Francês.

Observadores casuais podem imaginar, apenas pelo currículo, que Didier Deschamps é amado na França e saudado para além das suas fronteiras antes mesmo de conduzir os Bleus a mais uma final de Copa do Mundo no Catar. No entanto, quando o técnico da seleção marroquina Walid Regragui descreveu o colega francês no começo da semana como “o melhor do mundo”, muita gente torceu o nariz – e alguns continuam surpresos.

Deschamps, na verdade, raramente surge nos debates e nas conversas sobre os estrategistas mais brilhantes do futebol atual. Embora outra taça de campeão do mundo certamente bastasse para silenciar os críticos, ele continua sendo uma figura estranhamente polarizante no seu próprio país.

Não que ele mesmo se importe. Como jogador e como técnico, dentro e fora de campo, Deschamps nunca buscou os holofotes nem se deixou influenciar pela caça à aprovação alheia.

Deixar que as conquistas falassem por si sempre foi a abordagem preferida do ex-volante de 54 anos, que se juntou a Mario Zagallo e Franz Beckenbauer como os únicos a conquistarem uma Copa do Mundo como atletas e treinadores. Em um episódio famoso, Eric Cantona zombou que o antigo companheiro de seleção “nunca seria mais que o carregador de água”, acrescentando que “se pode encontrar jogadores como ele em qualquer esquina”. Deschamps deu a resposta perfeita: “Quantos jogadores você consegue encontrar numa esquina que ganharam dois campeonatos continentais?”

Agora, uma réplica semelhante pode ser dada aos que subestimam Deschamps como técnico da mesma maneira que Cantona o avaliava mal como jogador. Para os que continuam objetando, ele é pragmático ao extremo e deveria estar jogando um futebol mais vistoso com os jogadores que tem à disposição. Quando a França se classificou para a final da última Copa, um renomado comentarista do país chegou a ponto de dizer que a seleção seria “o campeão mais feio da história”. Muitos outros queriam que ele fosse substituído por Zinedine Zidane independentemente do desfecho.

Mesmo sem se abalar pelas críticas, Deschamps poderia facilmente observar que a sua escalação é tudo menos defensiva. O reposicionamento de Antoine Griezmann atrás dos três atacantes com responsabilidades mínimas na defesa, se é que alguma, se revelou o golpe de mestre do torneio – e é típico das soluções inovadoras que ele encontrou para resolver os enormes problemas com contusões.

Deschamps agora está a um jogo de fazer história novamente como o primeiro treinador desde Vittorio Pozzo, que conquistou o bicampeonato mundial em 1934 e 1938 no comando da Itália, a vencer duas Copas consecutivas. Mas até com o aceno dessa memorável façanha, o técnico da França não tem interesse em ocupar o centro das atenções.

“Eu não sou o mais importante aqui; o mais importante é o time”, afirmou Deschamps quando indagado sobre o possível recorde após a suada vitória francesa sobre o Marrocos. “Claro que eu estou orgulhoso e todos nós sabemos que agora temos a chance de defender o título na final. Isso é um grande feito. Mas na verdade eu não penso em mim. Só estou feliz com o fato de termos tido esse sucesso.”

Diante dessa humildade, restou a outros – sobretudo jogadores da atualidade e do passado – louvarem o herói não celebrado da França. Jules Koundé falou à FIFA sobre um homem que “faz de tudo para que os jogadores se sintam à vontade”, enquanto Raphael Varane elogiou a capacidade de Deschamps “de usar as qualidades de todos em prol de uma meta coletiva”.

“A maior qualidade de Deschamps é saber montar um elenco”, resumiu o ex-lateral da seleção francesa Patrice Evra durante a semana. “Às vezes ele não escolhe os melhores jogadores porque a motivação é ‘o craque é o time’. É alguém capaz de montar um elenco para ganhar um torneio. É simplesmente um grande treinador, e bastante humilde. Para mim, ele é de longe o melhor técnico francês.”

Se a sua equipe conseguir derrotar a Argentina no domingo, Deschamps talvez descubra que a França e o resto do planeta finalmente – talvez tardiamente, talvez ainda com relutância – concordam com a avaliação de Evra.

*Com informações da FIFA

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